Praia das Pedrinhas: A joia gonçalense negligenciada pelo Estado

Genecy na Praia das Pedrinhas em 2019

Genecy Mariano de Moraes, aos 81 anos, é o pescador mais velho da Praia das Pedrinhas, um lugar que já foi motivo de orgulho para os moradores de São Gonçalo, no fundo da Baía de Guanabara. Hoje, seu Genecy não consegue mais viver do que tira do mar. Perdeu as forças para remar para pontos cada vez mais distantes, atrás de peixes e camarões, pois a degradação deste antigo santuário é tamanha que o velho pescador chega a compará-la a uma privada.

O drama de seu Genecy não fica restrito apenas ao que está debaixo da linha d'água. A Praia das Pedrinhas (localizada na BR 101 - Niterói-Manilha) é um dos pontos mais atingidos pela deterioração. As margens estão tomadas por lixo, como garrafas PET, copos descartáveis e sacolas plásticas. Além disso, o mau cheiro é forte, resultado da falta de saneamento básico, já que o esgoto é despejado diretamente na Baía de Guanabara. Mas em 2013, a área passou por reformas com o apoio do então prefeito Neilton Mulim (2013-2016). Desde então, a orla conta com dezenas de bares e restaurantes, sendo bastante frequentada por moradores de São Gonçalo, Niterói e Itaboraí.

Praia das Pedrinhas em 2025

A bióloga e gonçalense Marcyllene Maria observou que houve uma grande movimentação em prol da estética, mas não tiveram a preocupação de resolver o problema estrutural da região.

— A orla recebeu obras de pavimentação, urbanização e paisagismo, tais como: nova iluminação, asfaltamento das ruas, bancos, mesas de cimentos, rede de internet gratuita, e expansão de novos comércios. No entanto, com a chegada do progresso à baía de Guanabara não veio acompanhada de políticas públicas, impondo aos pescadores mudanças drásticas em seu modo de vida. Junto com esse processo, veio também a poluição física e química, desmatamentos, as edificações, causando a diminuição do pescado e excluindo o pescador dos locais de trabalho.

Nascido e criado no bairro Boaçu em São Gonçalo, seu Genecy sempre trabalhou como comerciante por lá. Em 1998, mudou-se para o bairro Boa Vista, que abrange a Praia das Pedrinhas. Lá, passou a ter contato com a colônia de pescadores e viu na pescaria uma forma de complementar a renda familiar. Desde então, passou a atuar simultaneamente como pescador e mercador.

— Quando eu cheguei aqui, eu vi na pesca uma maneira de ajudar no sustento da minha casa, quando ia pescar, minha mulher ficava na nossa loja. A Praia das Pedrinhas nunca foi um exemplo de limpeza, mas naquela época, ela não era tão suja como é hoje, eu conseguia pescar peixes e camarões com uma certa facilidade.

Para o fundador do Movimento Baía Viva, o ambientalista Sérgio Ricardo, a situação nas comunidades pesqueiras e das praias de São Gonçalo é “extremamente preocupante”. Ele defende que não só do ponto de vista da crescente degradação ambiental, mas também da saúde pública.

— Os pescadores estão expostos a águas contaminadas por coliformes fecais e por chorume. Vazamento cotidiano do chorume do lixão ‘desativado’ de Itaoca [São Gonçalo]. A Baía de Guanabara está recebendo um bilhão de litros por ano. A segunda principal fonte é Itaoca. Sobre o saneamento, o que aconteceu é que o Programa de Despoluição da Baía da Guanabara, iniciado em 1995, financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, até hoje não foi concluído. A Estação de São Gonçalo funciona há 21 anos, no entanto, ela trata um volume irrisório, cerca de 10% de sua capacidade. Até hoje não foram concluídos os troncos coletores de esgoto.

A Secretaria de Meio Ambiente de São Gonçalo informou que no caso da Praia das Pedrinhas, por se tratar de uma baía, é de competência do INEA — órgão com o qual eu não obtive nenhum retorno.

Genecy se tornou um ícone da Praia das Pedrinhas

Aposentado, hoje seu Genecy é um dos pescadores mais respeitados da região, sendo considerado uma referência para os que chegaram depois.

— A galera é muito generosa comigo, fico feliz demais com todo esse carinho do pessoal.

O ancião também celebra iniciativas de limpezas do mangue, como o Desafio do Lixo. 

— Isso me enche de alegria, eles fazem o que as autoridades deveriam fazer… O mais bacana disso tudo é que eles são jovens, que ao invés de estarem preocupados com outras coisas, estão focados em melhorar o meio ambiente. Isso é muito importante... Eu gosto muito também quando professores trazem seus alunos pra cá, acho o maior barato.

Desafio do Lixo

Com o intuito de conscientizar a população sobre a importância da coleta de lixo para manter o mangue da Praia das Pedrinhas limpo. Três ativistas gonçalenses, o comunicador e ex-vereador de São Gonçalo (2020-2024) Romário Regis, a geógrafa Vitória Laís e a educadora ambiental Maria Beatriz se uniram e criaram o “Desafio do Lixo”, em 2019, (sem o apoio governamental, somente com o suporte dos movimentos sociais.) O projeto já retirou mais de 3,2 toneladas de entulho da orla do município e vem recuperando o manguezal da praia.

Limpeza do Mangue da Praia das Pedrinhas em 2023

Garrafas, canudos, tampinhas, sacolas plásticas, copos descartáveis, tênis, entre outros. São variados os tipos e incontáveis a quantidade de lixo que vão parar na praia, geralmente despejado pelos frequentadores do local e levado através da maré.

Há 6 anos, o Desafio do Lixo passa pelo mangue da Praia das Pedrinhas, deixando o lugar um pouco mais habitável para as pessoas.

De acordo com os organizadores, o programa contou com mais de quinhentos participantes. Incluindo universitários e estudantes do ensino médio das escolas públicas da cidade. Para Maria Beatriz, o êxito do projeto se dá pela coletividade.

—  Isso pode parecer pouco, mas juntos são muitos braços com força de vontade de fazer a diferença. Já foram mais de 5 toneladas de lixo que retiramos em 6 anos de ação. Além de colocar a mão na massa e ver o resultado na prática, esse tipo de atitude abre a mente da população para a questão ambiental. Precisamos falar sobre educação ambiental, além de nos movimentar para melhorar a qualidade de vida do entorno.

Espécies de animais

Na Praia das Pedrinhas, as espécies animais que são encontradas no fragmento de manguezal são o caranguejo-uçá (Ucides cordatus) e guaiamu (Cardisoma guanhumi). E peixes como pargo, tainha, pampo e aves como garça.